SOFTWARE DE CÁLCULO PARA
APLICADORES LEIPZIG

 

Sérgio Maurício Detoni Filho(1) e André Lima de Souza Castro(2)

1 Tecnólogo em Radiologia da Radiocare Centro Avançado de Radioterapia -
Grupo Oncoclínicas

2 Físico da Radiocare Centro Avançado de Radioterapia - Grupo Oncoclínicas e
Doutor pelo Departamento de Engenharia Nuclear da UFMG  

Setembro de 2021


Introdução

O uso de radiações ionizantes para o tratamento de lesões superficiais está consolidado e, atualmente, têm sido aplicado majoritariamente para câncer de pele não melanoma (carcinoma de células basais e de células escamosas) e também para irradiações de doenças benignas como a queloide (Nestor et alii. 2019). A irradiação de doenças benignas foi discutida por Leite, Fonseca e Castro em 2015. Bonaccorsi, em 2018, abordou a carcinogênese induzida por radiação.

A gama de opções e técnicas de tratamento disponíveis incluem equipamentos de raio X superficiais (30kV a 100kV), raio X de ortovoltagem (100kV a 300kV), feixes de elétrons produzidos por um acelerador linear com várias energias disponíveis e fontes radioativas seladas. As decisões clínicas de tratamento são baseadas no tipo de lesão, extensão, profundidade e localização anatômica. A escolha da técnica ou equipamento pode ser realizada também em função da taxa de ocupação deste equipamento ou questões relativas ao faturamento (Nestor et alii. 2019).

Os equipamentos de raio X de baixa energia estão sendo descontinuados e substituídos pelos aceleradores lineares devido à maior versatilidade deste último, tanto em relação às energias disponíveis quanto em configurações e tamanhos de campos de tratamento. Além disso, por trabalhar em uma faixa em que o efeito Compton predomina, o feixe de elétrons reduz o risco de radionecrose óssea existente nos equipamentos de raios X de baixa energia quando lesões próximas ao osso são irradiadas. Alternativamente à essas técnicas, o uso de braquiterapia de alta taxa de dose foi proposto. As vantagens do uso de fontes radioativas para lesões cutâneas superficiais constituem uma unidade de tratamento mais flexível, uma vez que podem ser usados diversos conjuntos de aplicadores durante o tratamento, um alto gradiente de dose, o que favorece a minimização da dose absorvida nos tecidos adjacentes e, normalmente, a maior disponibilidade deste equipamento (Sarudis).

Dentre os aplicadores disponíveis para a irradiação de lesões superficiais com braquite-rapia de alta taxa de dose estão os conjuntos Leipzig da Nucletron. Eles foram mencionados pela primeira vez em 1995 e têm sido objeto de pesquisa desde então (Evans et alii. 1997, Perez et alii. 2005). O conjunto de aplicadores Leipzig consiste de seis diferentes aplicadores em forma de cone com diferentes tamanhos e características dosimétricas. Cada aplicador é construído de uma liga de tungstênio (92%) e aço (8%) e contém uma capa protetora de plástico com 1 mm de espessura (removível) que absorve os elétrons secundários que são emitidos das paredes do colimador conforme a radiação primária interage. A orientação da fonte varia dependendo do tipo de aplicador, com o eixo longitudinal da fonte alinhado paralelamente ou perpendicularmente à superfície de tratamento, Figura 1.

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Figura 1. Desenho esquemático dos aplicadores com orientação horizontal e vertical da fonte. Adaptada de tese


Existem três aplicadores horizontais diferentes com os diâmetros de cone de 10, 20 e 30mm (H10, H20 e H30) e três aplicadores verticais com os mesmos diâmetros dos horizontais (V10, V20 e V30), Figura 2.

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Figura 2. Ilustração do conjunto de aplicadores Lepizig H1, H2, H3, V1, V2, V3. Pedraza

Combinando essas duas características, diâmetro de saída do cone e orientação da fonte em relação à superfície de tratamento, cada cone tem sua própria distribuição de dose característica. O cálculo da distribuição da dose não é trivial devido a geometria complexa dos aplicadores Leipzig e as múltiplas energias de fótons contidas no espectro do Iridio-192. Os fótons emitidos interagem por efeito fotoelétrico, espalhamento coerente e por interações Compton nas paredes do colimador e no material de encapsulamento da fonte, e produzem fótons e elétrons secundários que contribuirão para a composição da dose. A geometria e orientação da fonte é outro fator a ser considerado no cálculo da dose absorvida.

As características dosimétricas foram previamente investigadas comparando simulações de Monte Carlo com medições experimentais com filme radiocrômico. Além de medir os perfis de dose abaixo dos seis aplicadores Leipzig disponíveis, uma comparação entre a dose absorvida medida e um formalismo de cálculo de dose para fontes de braquiterapia sugeridas pela American Association of Physicist in Medicine (AAPM) foi realizado (Nath et al. 1995, Rivard et al. 2004).

Uma descrição completa da distribuição dosimétrica pelo código MCNP4C foi realizada por Pedraza et alii. 2009. Neste trabalho ele calculou o perfil de dose para os 6 aplicadores, a taxa de dose máxima a 0,05cm normalizadas para 10Ci (tabela 1) e o percentual de dose profunda (tabela2).

Tabela 1. Taxa de dose máxima normalizada para 10Ci na profundidade de 0,05cm

Tabela 1. Taxa de dose máxima normalizada para 10Ci na profundidade de 0,05cm

Tabela 2. Percentual de dose profunda para as 6 configurações de aplicadores..

Tabela 2. Percentual de dose profunda para as 6 configurações de aplicadores..

Com base nos dados do estudo de Pedraza et. alii 2009 o objetivo do nosso trabalho foi desenvolver um software em linguagem computacional C# para cálculo do tempo de tratamento à partir de um formalismo matemático baseado nos dados dosimétricos de referência para cada aplicador.

Metodologia

O software trabalhou como banco de dados fixos os itens a seguir. 6 aplicadores: posição da fonte horizontal e diâmetro do aplicador com 10, 20 e 30mm e posição vertical da fonte e diâmetro do aplicador com 10, 20 e 30mm chamados, consecutivamente, de L1FH, L2FH, L3FH, L1FV, L2FV, L3FV; Porcentagem de dose profunda em função de cada aplicador para as profundidades 0.05, 0.20, 0.50 e 1.00cm; Taxa de dose na profundidade de referência normalizada para a atividade de 10Ci, também específica para cada aplicador. Os dados de entrada do software são a atividade atual da fonte e a dose prescrita. Pode-se selecionar o tipo de aplicador e a profundidade de cálculo. Estes últimos buscarão as informações do banco de dados. O tempo de tratamento é calculado então pela dose prescrita dividida pela PDP da profundidade de cálculo e a taxa de dose para a atividade atual para o aplicador selecionado. A taxa de dose atual é obtida por uma regra de três simples utilizando a tabela 1.

Tempo de aplicação:

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Resultado

O software denominado LEIPZIG Calculator é acessado por uma página com login e senha previamente cadastrados pelo administrador do sistema, Figura 3.

Figura 3. Página inicial do LEIPZIG Calculator

Figura 3. Página inicial do LEIPZIG Calculator

Para realizar o cálculo do tempo de aplicação, clicar no ícone “novo cálculo” e selecionar inserir a atividade atual da fonte e a dose (itens editáveis), tipo de aplicador e profundidade de cálculo. Os campos “Médico”, “Físico”, “Paciente”, “MV” (ou número de registro) e data são obrigatórios, Figura 4.

Figura 4. Função calcular do software.

Figura 4. Função calcular do software.

Após selecionar o ícone “calcular” será exibido na tela o resumo dos parâmetros preenchidos e o tempo de aplicação, Figura 5. Um relatório impresso,  com todos esses dados,  pode ser obtido e arquivado.

Figura 5. Exemplo de resultado do cálculo.

Figura 5. Exemplo de resultado do cálculo.

Conclusão

O software desenvolvido foi validado por meio de diversas intercomparações com cálculos manuais e por fim aceito. Ele promoveu agilidade e segurança na obtenção do tempo de tratamento com uma interface intuitiva, organizada e de simples manejo.


Referências bibliográficas

Bonaccorsi, B. V. Carcinogênese radioinduzida. Radioterapia Mineira, 2018.

Evans, M. D. C., Yassa, M., Podgorsak E. B., et al. Surface applicators for high dose rate brachytherapy in AIDS-related Kaposi’s sarcoma. Int J Radiat Oncol Biol Phys 1997;39:769–774.

Leite, M. T. T., Fonseca, A. P. F. P., Castro, A. L. S. Radioterapia de doenças benignas. Radioterapia Mineira, 2015.

Nath, R. et al 1995. Dosimetry of interstitial brachytherapy sources: recommendations of the AAPM Radiation Therapy Committee Task Group No. 43. American Association of Physicists in Medicine Med. Phys. 22 209–34.

Nestor, M. S. Berman, B. Goldberg, D., Cognetta, A. B., Gold, M. Roth, W., Cockerell, C. J., Glick, B.  Consensus Guidelines on the Use of Superficial Radiation Therapy for Treating Nonmelanoma Skin Cancers and Keloids. J Clin Aesthet Dermatol. 2019 Fev; 12(2): 12–18.

Pedraza, R.; Rojas, E.L.; Mitsoura, E.     Dosimetric characterization of 192Ir source-Leipzig applicators sets for surface cancer treatment with Monte Carlo code MCNP4C.  Revista Mexicana de Ingeniería Biomédica, vol. XXX, núm. 1, junio, 2009, pp. 33-40

Pérez-Calatayud, J., Granero, D., Casal, E., et al. Monte Carlo and experimental derivation of TG43 dosimetric parameters for CSM-type Cs-137 sources. Med Phys 2005; 32:28–36.

Pérez-Calatayud, J., Granero, D., Ballester, F., Puchades, V., Casal, E., Soriano, A., Crispin, V. A dosimetric study od Leipzig applicators. Int. J. Radiation Oncology Biol. Phys., Vol. 62, No. 2, pp. 579–584, 2005

Rivard,  M. J. et al 2004 Update of AAPM Task Group No. 43 Report: a revised AAPM protocol for brachytherapy dose calculations.  Med. Phys. 31 633–74.

Sarudis, S.  Dose distribution beneath the Leipzig skin applicator set. Thesis for Master of Science in Medical Radiation Physics Department of Medical Physics Royal Perth Hospital Perth, Australia University of Stockholm, Karolinska Institute, Stockholm, Sweden. 66 p.