UTILIZAÇÃO DA FLUORITA NATURAL
COMO DOSÍMETRO

 Autor: Fausto Mafra Neto

Orientador: Dr. José Caetano Machado

Tese apresentada ao corpo docente do CCTN/UFMG, como parte dos
requisitos necessários para obtenção do grau de Mestre em Ciências { M. Sc. }, em janeiro de 1980

 

Março de 2023


Este trabalho acadêmico, despretencioso, foi levado a público, em 2004, pelo site da IAEA (Agência Internacional de Energia Atômica) na url https://inis.iaea.org/NCLCollectionStore/ Public/ PDF.


Dedico este trabalho

à minha esposa Naly, e a meus filhos Juliana, Arnoldo, Liliana e André.

Ao papai, mamãe e a meus írmãos.


Prefácio

Durante os anos de experiência na radioterapia sentimos sempre a necessidade de ter em mãos recursos para executar medidas, in vivo, no ato do tratamento com radiações, seja para conhecer a dose em algum ponto seja para conferir a colocação de uma barreira de proteção, 0 recurso indicado para esse trabalho é a dosimetria por termoluminescência e foi aí que procuramos nos situar. Começamos por procurar um dosímetro que pudesse entrar na rotina hospitalar da radioterapia sem aumentar o custo do tratamento.

Interessou-nos a fluorita natural, por ser um dosímetro pronto, dado pela natureza, e já conhecido na proteção radiológica, apesar de aparecer aí industrializado de uma forma especial. Investigamos a possibilidade de uso sob forma mais simples, como o dosímetro em põ, e terminamos por concluir que a fluorita natural seria a nossa solução.

As leituras dos dosímetros dependiam do laboratório de radioproteção do CDTN que nos foi aberto sem restrições , fato que nos faz sentirmos gratos ao amigo Mareio Tadeu Pereira que dedicadamente prestou-nos toda a assistência necessária.

0 processo experimental, totalmente executado no Instituto de Radioterapia Geral e Megavoltagem de Minas Gerais, teria sido bem mais estafante e menos seguro, não fosse a colaboração e o incentivo dos médicos titulares daquela clínica, além do trabalho incansável dos médicos residentes. Devo uma atenção especial ao médico residente do serviço Raul Fernando Pizzato, que tomou para sí o trabalho de colocação de dosímetros nos pacientes.

Agradeço ao Diretor do instituto de Geociências da UFMG, professor Wolney Lobato, que se preocupou, espontaneamente, em conseguir amostras de fluorita natural para este trabalho.

A meu irmão dr. -Johnny José Mafra, professor da Faculdade de Letras da UFMG agradeço a dedicação e paciencia com que acompanhou a redação desta monografia.

Aqui está um trabalho, simples mas objetivo, fruto de um esforço conjunto sob orientação tranqüila e segura de José Caetano Machado, professor do Departamento de Química da UFMG, que não mediu esforços para que este fosse realizado .

Meu muito obrigado ao professor José Caetano Machado e a todos aqueles que, direta ou indiretamente, deram sua contribuição.

Janeiro 1980


Resumo

Em estudo, a possibilidade de utilização da fluorita natural como dosímetro para radiações X e gama. Suas principais propriedades como a sensibilidade, linearidade, desvanecimento, desvio padrão, dependência da energia, etc, pelos testes experimentais realizados na área médica da radioterapia, revelaram um promissor dosímetro com a fluorita natural.


Conteúdo


Siglas e símbolos usados neste trabalho

Introdução

Primeira Parte

Introdução

Capítulo I - Termoluminescência

Capítulo II - Características do CaF2 natural

Capítulo III- Confecção do dosímetro

Capítulo IV - Calíbração do dosímetro de CaF2

Conclusão da primeira parte

Segunda Parte

Introdução

Capítulo I - Órgão crítico

Capítulo II - Medidas in vivo

Conclusão da segunda parte

Terceira Parte

Conclusão final

Bibliografia


Siglas e símbolos usados neste trabalho

CCTN- Curso de Ciências e Técnicas Nucleares

UFMG- Universidade Federal de Minas Gerais

HVL - Half Value Layer - espessura de material capaz de reduzir a metade, um feixe de radiação primaria

(Ag )* - Íon prata no estado excitado.

TL. - Termoluminescincia

NRL - Naval Research Laboratory

AEC. - Atomic Energy Comission

MBLE- Manufacture Beige de Lampes et de Materiel Electronique S/A,

Rad - Unidade de medida de dose absorvida. Corres - ponde a 100 ergs por grama de material absor- vente.

DT. - Dose-tumo

IEA. - Instituto de Energia Atômica

IAEA - International Atomic Energy Agency


Introdução

O homem antigo, na idade da pedra lascada experimentou a produção do fogo e aprendeu a controlá-lo. No século passado descobriu a dinamite e dela fez uso para o bem e para o mal. Hoje, como no passado, a humanidade assustada luta ainda com grande ansiedade, mas no sentido de poder controlar as radiações atômicas e nucleares. Os programas militares que executam testes com explosões nucleares cada vez mais poderosas, disseminando na atmosfera a poeira radioativa, e os programas denominados átomos para a paz que envolvem a produção de energia elétrica através de centrais nucleares, os radioisótopos e as maquinas produtoras de radiações de alta energia, para uso na industria ou na medicina, representam uma ameaça constante ao homem que ja não está seguro de sobreviver como tal. Por isso investiga, dia a dia, processos cada vez mais confiáveis para avaliação dos níveis de radiação ao seu redor e mede a dose absorvida.

A comissão Nacional de Energia Nuclear - CNEN - preocupa-se com justa razão, com a proteção dos trabalhadores em radiações e fixa normas de trabalho e doses permissíveis para estes, seja para corpo inteiro seja para órgãos críticos. Isso entretanto não se aplica a um portador de câncer em tratamento, a quem altas doses são recomendadas para a destruição do tumor, cabendo a indicação ao medico radioterapeuta , um especialista em câncer e em radiologia.

Ao delimitar o campo de irradiação o médico indica os órgãos a serem protegidos, o que conseguimos com alguma restrição. A dose absorvida em um ponto é a soma da radiação proveniente do feixe primário mais a radiação espalhada pelo próprio volume irradiado. 0 feixe primário pode ser reduzido em sua intensidade para 3% com 5 HVL de Pb, enquanto a radiação espalhada, que é função da superfície exposta ao feixe primário, dificilmente podemos reduzir. 0 calculo da dose nesses pontos protegidos é freqüentemente difTcil de ser executado ou até mesmo impossível, mas muitos deles podem ser dosados diretamente.

Em grandes centros de Física radiolõgica é comum a dosimetria por termoluminescencia com LiF:Mg. Este e um dosÍmetro produzido em laboratório, de custo elevado para nós principalmente pelos ônus de importação, e ainda de vida limitada. A fluorita natural, que é um cristal abundante em quase todas as regiões da Terra, é usada na Europa em programas militares, de forma especial produzida pela industria eletrônica Manufacture Beige de Lampes et de Materiel Eleotronique S/A.

Nosso interesse neste trabalho é mostrar as possibilidades práticas e de uso simplificado do CaF2 natural como dosímetro, em pó ou sólido, em forma de pastilhas, e ainda salientar a necessidade de uso rotineiro da dosimetria por termoluminescência nas irradiações programadas.

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1-Por radiações atômicas queremos dizer aquelas emitidas defora do núcleo, pelo átomo quando este interage por efeito fotoelétrico, efeito Compton ou por produção de pares, com partículas aceleradas.


PRIMEIRA PARTE

Dosímetro de fluorita natural

A priineira parte deste trabalho cuida de situar a fluorita natural diante de outros elementos usados normalmente na dosimetria e estuda algumas de suas propriedades como a curva de emissão TL, o espectro de energias, a sensibilidade, a linearidade, o desvio-padrão e a dependência em relação a energia.

Investigamos as formas de utilização como dosímetro, em pó ou solido, na forma de pastilhas, a partir da pedra bruta. A linearidade e a sensibilidade são influenciadas pelo tratamento térmico a que é submetido o cristal. Por isso demos especial atenção a esse fator, associando ãs nossas experiências os resultados obtidos por outros autores.

Concluímos com a calibração do dosTmetro para uso na dosimetria clínica.


Capítulo I - Termoluminescência

Emissão termoluminescente

A ação da radiação ionizante em um cristal constituído de um sal puro consiste na formação de um par elétron-buaco, na faixa energética intermediária situada entre a banda de valencia e a banda de condução. Um elétron, nessa faixa intermediaria, ganhando energia térmica, é jogado para a banda de condução e se torna elétron livre. Na banda de condução o elétron migra através do cristal e recombina-se com um bura- co na faixa energética intermediária, emitindo o excesso de energia sob forma de luz visível. Como a formação da luminescência teve origem na transferência do elétron, da faixa intermediária para a banda de condução, por excitação térmica, o processo e chamado termoluminescência(1).

A termoluminescência da fluorita natural está ligada à impureza existente no cristal e, quanto ã formação de luminescência, a fluorita comporta-se como um sal dopado, emitindo na faixa energética característica da impureza.(2). A figura 1 é um diagrama de um processo de emissão de um sal dopado com íon Ag+.

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1- SCHULMAN,JH-Survey of Luminescence Dosimetry—US Naval R Laboratory, publicação AEC 8 Sinposium Series, Luminescence Doxiaetrie 1967. p 11


Fig 1- Diagrama de um processo de emissão de um sal dopado com Ag+ ( NaCl:Ag, KCl:Ag }.

Neste modelo um elétron é, por excitação térmica, ejetado para a banda de condução onde migra através do cristal e recombina-se com um Ton Ag+ formando (Ag+)* que é instável e que retorna ao estado fundamental com emissão de luminescência característica da Ag, isto é, azul e ultra violeta.

A figura 2 mostra a distribuição de energias da fluorita natural com comprimentos de onda que variam de 3500 a 5000 ângstrons, sendo que o máximo de intensidades ocorre para 3800 que corresponde ao azul violeta(3), faixa de sensibilidade da maioria das foto-multiplicadoras.

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2- SCHULMAN, J H - op. cit. p. 13


Sistema de medida


A dosimetria por termoluminescência consiste da medida da Luz TL emitida pelo cristal durante um processo de aquecimento. A quantidade de luz emitida é proporcional a dose de radiação responsável pela formação dos pares elétron -buraco no cristal. A instrumentação de leitura é muito simples e consta de um tubo foto-multiplicador montado sobre um sistema de aquecimento e ligado a um registrador ou contador digital. 0 sistema de aquecimento e formado por uma pequena panelinha de platina, com cerca de 7mm de diâmetro, com controie automático de tempo de aquecimento. Algumas leitoras medem a intensidade TL com um processo de aquecimento logarítmico. Isto é muito útil porque permite levantar diretamente a curva de emissão TL x TEMPERATURA. Outras leitoras, por sua vez, executam a leitura a uma temperatura constante, depois de um pre-aquecimento a temperatura mais baixa e também constante. A finalidade do pre-aquecimento é facilitar o equilíbrio térmico do cristal, para leitura de um determinado pico; eliminar os picos de baixa temperatura que na fluorita natural constituem cerca de 15% da luminescência total integrada, e ler apenas os picos a temperaturas mais altas que são estáveis.

Os picos de baixa temperatura da fluorita natural decaem, a temperatura ambiente, em mais ou menos 72 horas. Após esse prazo, a fluorita guarda informações por tempo indeterminado. As leituras de um dosímetro de fluorita devem ser realizadas apôs esse prazo para assegurar a leitura, apenas dos picos de alta temperatura. Se,e ntretanto, a leitora é provida de pre-aquecimento, as leituras podem ser executadas imediata-mente, porque aí são eliminados os picos de baixa temperatura que são a principal causa de erros na dosimetria.

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4- SCHAYES, R et a l i i - Thermolumitiescent Properties of Naturai Calcium Fluoride - Monofacture Beige de Lampes et de Materiel Electronique S/A , publicação AEC 8 Simposium series, Luminescence Dosisetry - 1967, p 156



Capítulo II - Características da Fluorita Natural

Cristais termoluminescêntes

Dos cristais termoluminescentes muitos têm sido usados na dosimetria, principalmente o LiF:Mg que foi muito bem estudado por J. R. Cameron e produzido principalmente por Harshaw Chemical Company. A principal característica que torna o LiF:Mg um dosímetro de maior uso é a sua imdependência em relação a energia e a possibilidade de ser usado sob forma de cristais inteiros de formato e tamanho de nosso interesse, pois o LiF pode ser fundido e moldado sem prejuízo para as propriedades do cristal. Cameron cita alguns fósforos de maior iimportãncia prática e relaciona suas características principais (tabela 1). Entre os fósforos apresentados os mais importantes para a dosimetria até o momento, está a fluorita natural (CaF2 natural} que aparece com algumas vantagens em relação aos demais.

O resultado mostrado na tabela 02 converge para o valor verdadeiro que pode ser obtido tomando-se um número infinito de divisões da fonte e somando-se as contribuições através da expressão (4) que foi originalmente proposta, em 1921, por Rolf Sievert (Johns e Cuningan, 1969).

A fluorita natural ê um cristal abundante em quase todas as partes da Terra e suas propriedades são conhecidas por diversos autores, destacando-se trabalhos de Watanabe, Schayes, Harvey e muitos outros. Essas propriedades variam enormemente de acordo com as diversas colorações desse cristal e algumas são indicadas para a dosimetria, principalmente a fluorita verde puro. As variações nas propr|edades dos diferentes tipos de fluorita natural são encontradas nas curvas de emissão TL.

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1-  Cameron, J R - Radiophotoluminescent and TL Dosimetry - Department of Radiology and Physics, U. Wisconsin, Manual on Radiation Dosiaetry ,
New York, Marcel Kekker, Inc. 1970 p 115

2-  FÓSFOROS são todos os cristais que emitem luminescência por efeito de aumento de temperatura


A curva de emissão


A curva de emissão da fluorita natural é bastante complexa e apresenta três picos fundamentais, pico I em 80(oC) pico II em 175(oC) e o pico III em 260(oC). Picos adicionais podem aparecer, dependendo do tipo de fluorita em uso ou do tratamento térmico a que é submetida. São eles os picos I’ em 100(oC), pico II' em 230(oC) e o desproporcional pico III' por volta dos 300(oC), que é o mais importante para a dosimetria.

Schayes(3) comparou curvas de emissão TL de quatro tiipos desse fósforo, em amostras que não exibiam os mesmos picos. Nessa comparação, um fato importante esta bem claro : Se duas amostras exibem um mesmo pico, este aparece na mesma temperatura para as duas amostras, isto é, amostras de um mesmo tipo apresentam os mesmos picos e sempre nas mesmas temperaturas. A curva de emissão TL de um cristal pode ser usada como meio de seleção de cristais de mesmas propriedades termo!uminescentes. 0 uso da fluorita natural na dosimetria requer um trabalho inicial de seleção de amostras de mesma curva de emissão, isto é, amostras cujas curvas de emissão contenham picos de mesma amplitude e o mesmo número de picos.

A area integrada sob a curva TL x TEMPERATURA corresponde à luz total emitida, durante um processo de aquecimento, e é proporcional à dose de radiação absorvida pelo cristal. Se dispusermos de amostras de mesma qualidade e se repetirmos a variação de temperatura com a mesma taxa de aquecimento, teremos a mesma área para amostras que absorverem a mesma dose. A dosimetria pode ainda ser realizada, tomando-se como elemento de medida a altura de um determinado pico estável. Amostras de mesma qualidade repetirão a altura desse pico, sempre que receberem a mesma dose e se sujeitarem a mesma variação de temperatura. Em nosso caso optamos pela TL total integrada em um contador digital, por se tratar de uma leitura direta com equipamento simplificado.

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3- SCHAYES, R et alii. Op. cit. p 139


A sensibilidade


Dois tipos de fluorita foram por nós examinados com base na sensibilidade a radiação natural, a qual estiveram expostas durante toda a sua fase de formação. Testes foram executados com cristais de coloração roxa e verde. Os de cor roxa revelaram-se imprestáveis para a dosimetria. Passamos então ao exame daqueles de coloração verde os quais ultrapassaram as expectativas. Quanto mais intensa a cor verde, mais sensível é o cristal. Quando comparada com outros cristais de uso na dosimetria, a fluorita aparece sempre como o mais sensível de todos. Na tabela 1 está com sensibilidade vinte e três vezes maior do que o fluoreto de lítio. A tabela 2 mostra que precisamos fornecer ao cristal de CaF2-natural, denominado tipo E pela MBLE, 635 eV para liberar um fotoelétron, enquanto para liberar o mesmo fotoelétron no fluoreto de lítio precisamos fornecer 42000 eV. 0 fluoreto de cálcio natural e o mais sensível dos cristais em uso na dosimetria, isto é, o CaF2 natural e o cristal que mais transforma dose de radiação em luz TL.


A sensibilidade da fluorita natural, como pudemos verificar, varia muito com o tipo de tratamento térmico a que é submetida, isto é, temperatura e tempo de recozimento . Quando a temperatura cresce acima de 600(oC), a ssnsibilidade diminui gradativamente até a destruição. Na temperatura de fusão, a fluorita se descaracteriza completamente. As temperaturas e tempos de recozimento que adotamos são aquelas já em uso pelos principais autores. Para aumento de sensibilidade adotamos o choque térmico em nitrogênio líquido, como o mostram, na tabela 3 capítulo III, os resultados experimentais. Outros o fazem com uma super dose. 0 processo que adotamos é usado por Watanabe que o denomina tempera.

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4- SCHAYES, R et alii. Op. cit. p 142


A linearidade


Todos os autores são coerentes quanto ã faixa de uti1idade da fluorita natural, que é a faixa de linearidade do dosTmetro. Um trabalho bem detalhado, realizado por Watanabe e Okuno, demonstra a linearidade e a supralinearidade para os picos III e III' que são os picos estáveis normalmente utilizados na dosimetria. A supralinearidade consiste no aumento da razão TL/Rad. Logo a seguir vem a saturação por volta de 10Rad, Para a fluorita disponível ao nosso uso verificamos a linearidade desde 200mRad até 600Rad, não alcaiçando valores inferiores a 200mRad por falta de condições físicas apropriadas a exposição e leitura nessa faixa de dose. 0 limite superior de 600 Rad não foi ultrapassado por falta de ínterêsse para este trabalho.


A composição da fluorita natural

"A fluorita natural é um cristal formado durante os processos hidrotermais(5) composto de 51,2% de Ca e 48,8% de F.. Pode ser encontrada em diversas cores, como amarela, verde, azul e violeta, Raramente é incolor.’ A coloração é devida a impurezas existentes no cristal. Os de cor verde, em uso neste trabalho, foram estudados qualitativamente com objetivo de determinar os elementos dopantes que são os responsaveis pelo processo de emissão termoluminescente.

Examinamos o cristal por ativação e por difração de raios X(7). Esses testes revelaram a presença de Mg, Na e Cl, bem como traços de Fe, Si, S, K, Al e Ti. Deixamos de realjzar um estudo quantitativo dos elementos dopantes por consjderã-lo irrelevante para este trabalho.

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5- tiidrotermais sao um "conjunto de fenômenos geológicos realizados pelas soluções aquosas quentes derivadas dos magmas na sua última fase
de consolidação e dos quais resulta a formação de rochas e minerais característicos.”Novo Dicionário Brasileiro Melhoramentos 4a ed.

6- BETEJTIN, Â. Curso de Mineralogia. Moscou, editorial Mir, 29 edição 1970. p. 274 - O autor da citação não considerou impurezas na composição
do cristal.

7- As analises de nessa fluorita foram realizadas no Dep. de Quusíca da UFHG cora a colaboração do professor Elias Mansur Heto.


Capítulo III - A confecção do dosímetro

De posse da pedra bruta, podemos ter em poucos minutos e em condições de uso, um dosímetro de grande sensibilidade. Se desejamos uma grande quantidade de dosímetros teremos que trabalhar diversas pedras e deveremos, antes de tudo, certificar-nos de que são todas do mesmo tipo, isto e, todas têm a mesma curva de emissão TL e, portanto , respondem igualmente à radiação sensibilízante.

A fluorita natural, que até o momento é usada rotineiramente sob forma especial, industrializada por MBLE, pode ser usada em pó ou associada a uma matriz solida, em forma de pastilhas. 0 dosímetro, quando em pó, é de maior sensibilidade do que quando usado associado a outros elementos , em pastilhas, mas requer cuidados especiais durante a leitura, na colocação e retirada da panelinha de aquecimento. Re_ quer cuidados principalmente na retirada, para evitar a contarninação de uma leitura para outra, e ainda mais se trabalhamos na faixa de dose da ordem de mRad.


Dosímetro em pó


Transformação da pedra bruta


Moída a pedra bruta, selecionamos grãos entre 100 e 200 mesh-Tylev. Esta separação ê necessária para facilitar o manuseio e evitar a perda contínua de massa, pois os grãos menores são aderentes e provocam maior contaminação do sistema de aquecimento. Se os grãos são maiores do que aqueles da faixa separada, se são muito grandes, talvez por efeito de um gradiente de temperatura no interior do cristal, ocor rem a sua ruptura e destruição, espalhando fragmentos como numa esplosão e perdendo-se a dosimetria.


O tratamento térmico


Para ser usada como dostmetro, a pedra bruta necessita de um tratamento térmico para limpar a TL induzida por radiação natural. Atenção especial deve ser dada a esse tratamento, porque ele reflete-se diretamente na qualidade do dosímetro que vamos obter. 0 valor da temperatura de recozjmento e o tempo de recozimento, a exposição á luz, são fatores que afetam a sensibilidade e o desvio-padrão do dosTmetro. Esses fatores modificam a curva de emissão, seja criando picos que não existiam normalmente naquela qualidade de fluorita, seja fazendo desaparecer picos. Toda fluorita perde rapidamente em sensibilidade quando submetida a temperaturas superiores a 600 oC ou a longos tempos de recozimento.

D tratamento térmico por nós adotado consta, para a fluorita virgem, de um recozimento a 600 oC por 15 minutos e, a seguir, de um choque térmico em nitrogênio iíquido para aumento de sensibilidade.

0 efeito do choque térmico na sensibilidade foi verificado com a irradiação de amostras comparando a leitura das que foram tratadas por esse processo com as que sofreram resfriamento lento no ár. A tabela 3 contêm pares de amostras tratadas por processos diferentes e irradiadas com mesma dose. Podemos verificar que a maior leitura foi sempre daquelas que foram resfriadas com um choque térmico.

Para que possa ser reutilizada, a fluorita deve receber novo tratamento térmico, chamado de tratamento de pós exposição e realizado a temperatura mais baixa para limpar a TL que induzimos no cristal. Estudos realizados por Schayes(1) mostram çue 450 °C per 30 minutos e o tratamento indicado e este foi o comportamento por nós adotado,

A fluorita após submetida a tratamento térmico, seja ela virgem ou não, está pronta para ser calibrada e usada como dosímetro. Seu uso na dosiroetria de pessoal, cuja faixa de dose e da ordem de milirad, requer proteção contra exposições a luz, isto é, o dosímetro não deve ser exposto à luz vizível após receber tratamento térmico, porque pode sensibilizar picos estáveis e danificar a dosimetria. Os dosímetros de fluorita natural devem ser manuseados em câmara escura,


Influência da massa




Para verificar a influencia da massa de CaF2 na resposta TL e decidir que quantidade utilizar em um dosímetro, preparamos dez amostras, em cápsulas de gelatina, com massas variáveis e submetemos todas a uma mesma dose de raios X em acelerador linear de 6 Mev, A figura 7 relaciona a TL integrada como função da massa e mostra uma variação linear até 50 mg, além da qual a intensidade TL satura. 0 uso de dosímetros em pó com massas menores do que 50 mg não i indicado, porque pequenos erros na massa implicam grandes erros de leitura e estaremos adicionando ao dosímetro uma causa intrínseca de erro. Pela curva podemos verificar claramente que dosímetros em pó devem ter massas entre 70mg e 80mg, massas que mostram semelhança de respostas para a mesma dose. Massas acima de 90mg parecem trazer jã uma resposta menor, o que se pode atribuir à auto absorção,

Concluímos ainda que, se tomarmos uma medida padrão, poderemos reproduzir dosímetros encapsulados em pó com erro na massa inferior a 3% conforme podemos ver na tabela 4. Erro dessa ordem não implica variações na resposta, se a medida é de aproximadamente 90mg, porque este valor se situa no platô da curva em posição mais ou menos central. Se eliminarmos os dosímetros de maior desvio de massa poderemos assegu- rar uma resposta de maior fidelidade para a dosimetria.


Dosímetro sólido


A fluorita ja é conhecida e usada na dosimetria de pessoal. A industria eletrônica belga, Manufacture Beige de Lampes et de Materiel Electronique S/A, produz dosímetros para uso militar. Esses dosímetros especiais têm a forma de uma lâmpada ou válvula em que o cristal, na forma de pó, é fixado sobre o filamento que, quando aquecido, funciona como a panelinha de aquecimento das leitoras comuns. Medindo cerca de sete centímetros de comprimento, tais dosímetros tornam-se praticamente inúteis para medidas em cavidades ou em profundidades, como é o caso da dosimetria clTnica.

0 cristal de CaF2 natural não pode ser submetido a altas temperaturas, porque perde suas propriedades termoluminescentes. Temperaturas superiores a 600 oC causam danos irreversíveis nas propriedades do cristal. Este pode, entretanto, ser associado a materiais que formam a fase líquida, a temperaturas mais baixas, quando submetidos a altas pressões, como CaCl2, KC1+BaCl2, LiF etc. Essas substâncias, etc. Essas substâncias quando comprimidas a altas pressões como 6000Kg / cm e aquecidas a temperaturas apropriadas, formam a fase líquida e servem de sustentação para o cristal de CaF2. A necessidade de pressões tão altas torna difícil a confecção de pastilhas em matrizes de pequeno calibre como 0,5 ou 0,3 cm.

Nossas experiências levaram-nos a descoberta de uma solução;compactaramistura,empo,abaixapressão, oque dispensa o aquecimento necessário para o processo de sinterização.

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2- GONÇALVES, G E . Diagramas de Equilíbrio Quaternário; Construção e e Interpretação, Guarapari, XIX congresso de cerâmica 1975, p. 9.


A confecção da pastilha

0 cristal de CaF2 natural, após selecionado, é moído bem fino e misturado homogeneamente ao CaSO4 : H2O. A mistura é compactada, a baixa pressão, em alicate manual, formando uma pastilha, porém frágil. A seguir é submetida a um processo de absorção de água e finalmente é colocada a secar. 0 resultado é uma pastilha rTgida e boa resistência mecânica, suficiente para trabalhos de dosimetria. Este processo permite a produção em escala, pois, não necessitando de altas pressões, a mistura pode ser compactada em compressoras automáticas.

Os dosímetros assim obtidos, após receberem um tratamento térmico para limpar a TL natural, estão prontos para serem usados.


Efeito da taxa de dose


Cinco grupos de três dosímetros forara irradiados em acelerador linear de 4 MeV para verificação da "influência da taxa de dose na resposta do dosímetro de CaF2 natural. Todos os dosímetros foram irradiados, nas mesmas condições, colocados em um bloco plástico fixo, em um campo de 10x10 cm2 e a 80cm de distância do foco de raios X. Na superfície do bloco foram feitos três pequenos orifícios em torno do raio central, separados de 120 graus, alojando exatamente um dosímetro cada orifício, para permitir a reprodução de exposição dos grupos seguintes. A tabela 5 mostra a leitura media de cada grupo, todos irradiados com taxas variadas.

0 desvio-padrão dos 15 dosímetros irradiados foi da ordem de 1,0% o que garante que a fluorita natural em uso é independente da taxa de dose.


Dependência em relação à energia

A fluorita natural aparece na literatura(3) como altamente dependente da energia. Foi exatamente o que encontramos para energias situadas abaixo de 600 KeV. Para energias superiores encontramos divergências situadas dentro da faixa normal de erro. Os resultados experimentais, concordam com os resultados teóricos apresentados por Cameron apesar das nossas limitações materiais para obtenção de medidas. A figura 7 compara nossos resultados experimentais com a curva calculada, para o CaF2 : Mn, pelo Naval Research Laboratory e apresentada por Cameron.

Esta dependência em relação a energia é considerável, quando o dosímetro é usado em medidas de pessoal, na proteção radiológica, mas é insignificante, quando fazemos medidas em um feixe, de espectro continuo, pois sua energia efetiva sempre pode ser determinada e o dosímetro pode ser calibrado para cada energia efetiva que vamos dosar.

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.3- CAMERON, J R. op. cit p. 118


O desvio-padrão


O desvio-padrão dos dosímetros termo!uminescentes depende da dose. Bjarngard et alli (4) mostram que os desvios para discos de fluoreto de lítio embebido em teflon, variara de 3% a 15%.

As medidas realizadas para a fluorita natural, são apresentadas na figura 8, dentro das nossas possibilidades experimentais, para duas formas de dosímetros utilizados neste trabalho; em pastilhas e em pó. Os dosímetros em pó apresentam uma variação de 7% para dose de 0,2Rad até 1,0% para 50Rad.

As pastilhas estão numa faixa mais alta de desvio- padrão. Os testes realizados com pastilhas de 0,3 cm de diâmetro mostram variação de 30% para dose de 0,5 Rad ate 6% para dose de 5 Rad, Apesar de ser menos preciso do que os dosímetros em pó, as pastilhas prestam-se perfeitamente para a dosimetria clínica, que requer dosímetros de pequena dimensão e dispensa a alta precisão.

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4- BENGT E. BJARNGARD, RICHARD C. McCALL, and IRVING A. BSRSTEIN. - Lithium Fluoride- Teflon Thermoiumínescance Dosimeters.
Massachusetts, publicação AEC 8, Simposiuin Series, Luminescence Dosimetry, 1968 p. 308.


Capítulo IV - Calibração do dosímetro de CaF2


A utilização de dosímetros termoluminescentes implica tratamento térmico e calibração antes de cada medida, a calibração consta da construção de uma curva TI x DOSE, na faixa em que o dosímetro será utilizado, Para construir a curva de calibração utilizamos amostras separadas dentre aquelas a serem usadas na dosimetria, porque é necessário que todas tenham recebido o mesmo tratamento térmico. As amostras restantes quando expostas a radiação, podem ter suas doses lidas diretamente na curva de calibração.

Como exemplo queremos demonstrar como procedemos para efetuar uma calibração, a partir da pedra bruta, para dosímetros construídos com o cristal em poó e encapsuiados em cápsulas de gelatina,

Preparação do dosímetro


Escolhemos cuidadosamente a pedra de coloração verde puro e sem variações na intensidade da coloração. Moemos e peneiramos a pedra para separar grãos entre 100 e 200 mesh-Tyier para termos grãos de mesmo tamanho em todos os dosímetros e também para facilitar o manuseio, 0 cristal em pó, apôs separado na peneira, foi levado ao forno, previamente aquecido a 600 oC, durante 15 minutos para eliminar a TL natural. Para completar o tratamento térmico, a fluorita, ao sair do forno, foi submetida a um choque térmico, em nitrogênio líquido, para aumento da sensibilidade. Após a retirada do forno, o cristal foi protegido contra exposições a luz, o que deve ser feito, porque a fluorita é autamente sensTvei a essa faixa de energia. 0 cristal em pó, assim tratado, e armazenado em frasco escuro está pronto para ser calibrado.

A curva de calibração


Preparamos 100 cápsulas de gelatina, com o cristal em pó, utilizando uma pequena medida de cerca de 90 mg. As cápsulas estão numeradas de 1 a 100 e os trinta primeiros dosímetros foram utilizados para a calibração. Os dosTmetros foram irradiados em grupos de três, na posição de equilíbrio eletrônico em um campo de 10x10 cm2 , campo padrão de calibração de feixe.

A tabela 6 relaciona as doses dadas a cada grupo de três dosímetros com as leituras médias, e com esses valores construímos a curva TL x DOSE que fornece a equação de calibração.

em que b e a são constantes características da curva de calibração.

Os setenta dosímetros restantes estão agora em condições de uso nessa faixa de dose com um desvio-padrão da ordem de 1,0%.

Com os pares { TL, DOSE ) ajustados pelo método dos mínimos quadrados encontramos a equação da reta da figura que é a equação de calibraçao:


Linearidade dos dosímetros sólidos

A linearidade dos dosímetros sólidos foi estudada como teste para pastilhas de CaF2 + CaSO4:H2O

Irradiamos seis dosimetros, em forma de pastilhas de 0,5cm de diâmetro, para verificação da linearidade. As pastilhas foram selecionadas pela espessura e irradiadas, una a uma, em acelerador linear de 6MeV, na posição de equilíbrio eletrônico, com os resultados na tabela 7.

Esses resultados foram ajustados pelo Método dos mínimos quadrados e deram a curva de calibração da figura 10


Conclusão da primeira parte



Nos quatro capítulos que constituem essa primeira parte, pretendemos demonstrar a vantagem da fluorita naturai sobre outros sais de uso na dosimetria, o processamento da pedra bruta até a obtenção do dosímetro e sua calibração. A facilidade de obtenção em grandes quantidades, o custo de operação, a sensibilidade, linearidade e desvio -padrão são características que nos levaram a escolha desse fósforo para este trabalho. A linearidade da fluorita natural satisfaz a todas as faixas de dosimetria de rotina, seja na proteção radiolõgica, seja na dosimetria clínica, seja ainda na indústria, medindo doses desde cerca de 10mRad até 10Rad com um mínimo de desvio padrão, em relação a outros dosímetros. Seu desvanecimento, desprezível para os picos III e III’, permite guardar informações por tempo indeterminado.

A fluorita natural é um sal dopado por uma serie de elementos encontrados em maior ou menor proporção. Estudamos qualitativamente os componentes dopantes, por ativação e por difração de raios X, encontrando Mg, Cl, Na , bem como traços de Fe, Si, S, K, Al, Ti. Esses dopantes respondem, possivelmente, pela complexidade da curva de emissão TL x TEMPERATURA, em relação a outros cristais , principalmente o CaF2Mn que apresenta um pico na temperatura de 260 oC.

A forma em que o dosímetro deve ser utilizado depende da faixa de dose em que vamos trabalhar. As pastilhas compostas de CaF2 + CaSO4:H2O constituem um dosímetro que perde na sensibilidade em relação ao CaF2 puro, em pó, sendo sua aplicação mais indicada para a faixa de dose de uso na medicina. 0 dosímetro de fluorita natural em pó satisfaz a todas as faixas de dose e é a forma mais simples de ser apresentado.


SEGUNDA PARTE

Dosimetria com fluorita natural

Concluída a otimização do dosímetro quanto à sensibilidade, linearidade e desvio-padrão, passamos à realização de testes para verificação da viabilidade de uso na dosimetria

de rotina. A adoção de um instrumento de medida por um laboratório de dosimetria depende de sua consagração, isto ê, depende do numero de medidas ja realizadas e dos resultados obtidos.

Nosso dosímetro passou por uma série de testes em dosimetria de feixes de intensidades bem definidas, e a seguir foi utilizado para medidas de doses desconhecidas.

No nosso meio, esses testes poderiam ser realizados em dois setores de dosimetria: a proteção radiológica e a área medica. Realizar testes de dosimetria na area de proteção radiológica não pareceu muito viável, uma vez que aí iríamos lidar com doses imprevisíveis e com energias mistas e desconhecidas.

Escolhemos, então, a área médica da radioterapia, que hoje dispõe de maquinas produtoras de raios X de alta energia, de grande precisão, com taxas de doses e energias variáveis. Essas máquinas são importantes para nõs, nesse tipo de trabalho, porque fornecem doses perfeitamente controláveis, na faixa de Rad. Além das maquinas de raios X, a área medica dispõe de fontes de Cs137, Co60, Ra226 para irradiações com raios gama.


Capítulo I - Órgão crítico


As diversas partes componentes do corpo humano reagem de maneiras diferentes quando são irradiadas, isto ê, apresentam diferentes sensibilidades às radiações. "Embora existam, evidentemente, diferenças individuais, os tecidos mais sensíveis a radiação são o linfóide, baço, medula óssea, órgãos de reprodução e o aparelho digestivo. São de sensibiiidade intermediária a pele, os pulmões, o fígado, enquanto os músculos e os ossos, para o homem adulto, são os menos sensíveis."(1)

Para um cidadão comum ou um trabalhador em radiações, os órgãos de maior sensibilidade são órgãos críticos e recebem cuidados especiais de dosimetria. Para um doente em tratamento com radiações, seus órgãos críticos devem ser definidos individualmente, para cada tipo de tumor e para cada tipo de tratamento indicado. Para destruir um tumor, o médico radioterapeuta recomenda uma dose como 4000 ou 5000 Rad, a ser dada durante um determinado período como 4 ou 5 semanas. Essa dose é chamada dose-tumor. Se um determinado órgão sadio é vizinho ao tumor e não suporta tal dose sem sofrer danos, a sua proteção é recomendada. Para um doente em tratamento, os órgãos sadios, que não suportam a dose-tumor , serão chamados de órgãos críticos. Relacionamos abaixo alguns casos de grande volume irradiado, definindo para cada um os órgãos que são considerados críticos e devem receber cuidados especiais de proteção:

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1 - GLAST0NE, S . SESONSKE, A . Ingenieria de Reatores Nucleares. Barcelona, Editorial Reverté. 1975 p. 568.

a) Irradiação de Cabeça e Pescoço j

ouvido

cristalino

dentes

tiróide

medula óssea

b) Irradiação de Tórax

ouvido

cristalino

dentes

tiróide

medula õssea

genitais

c) Irradiação de Abdomen

genitais

bexiga

reto

cristalino

d) Irradiação de Pelve

cristalino

estômago

testículos

e) Irradiação de Útero

cristalino

bexiga

vagina

reto

estômago

No proximo capitulo apresentaremos alguns casos de dosimetria in vivo realizada em pacientes que se submetiam a tratamento em aceleradores lineares com energias ate 6 HeV.


Capítulo II - Medidas in vivo


Antes de iniciarmos a apresentação da dosimetria, para melhor compreensão, devemos dar alguns esclarecimentos quanto ao tipo de irradiação e quanto ao feixe de radiação, ja que estamos tratando de assunto bastante especializado.

Um indivíduo portador de uma doença maligna é encaminhado a clínica de radioterapia com um diagnóstico de tumor ou com a indicação do local onde foi retirado um tumor. 0 radioterapeuta, por exame local ou radiográfico, indica o volume a ser tratado e a profundidade da lesão, como na figura 10. 0 paciente ê, então, submetido a um feixe de radiação primária ( região 1), sendo a dose totalizada pela radiação espa- lhada pelo próprio volume ( região 2 ) e pelas paredes da saIa.

Um Órgão crítico, encontrado nessa região, pode ser protegido de varia maneiras. Em primeiro lugar o feixe prímário pode ser dirigido de modo a não atingir tal órgão. Se isto não é possível, coloca-se uma barreira de chumbo para reduzir a intensidade da radiação primaria incidente naquele órgão.


Medidas no feixe primário

As medidas iniciais foram realizadas em profundidade, dentro do feixe primário, com objetivo de verificar a qualidade do dosímetro. Foram usados dosímetros de fluorita em pó, em cápsulas de gelatina, com cerca de 90 mg cada. As primeiras medidas foram tomadas em uma irradiação de pelve total com os dosímetros introduzidos na cavidade pelvica por via vaginal.

Um dosímetro, colocado em uma sonda plástica, foi introduzido dentro do útero de modo a ficar na posição do raio central e o volume foi irradiado por quatro campos como na figura 11, com uma dose-tumor calculada para 200Rad na posição do dosímetro, centro do volume irradiado.

O valor medido coincide com o valor previsto, com um erro de 0,5%, o que é insignificante para a radioterapia.

Quatro dosímetros foram utilizados para medida da dose na irradiação da pelve, agora fora do raio central. Foram preparadas duas sondas com dois dosímetros cada, alinhados de modo a serem irradiados em pontos ligeiramente diferentes da vagina, sendo a pelve irradiada por dois campos, anterior e posterior. Nesses casos, a dose esperada na vagina e superior a dose no centro do volume irradiado, porque esses pontos situam-se mais próximo da superfície irradiada, estando, portanto, em uma curva de isodose de maior valor .

A cavidade pelvica foi irradiada para complementaçâo de dose, em campos paralelos e opostos, com uma proteção central de quatro centímetros de largura, cobrindo o útero e a vagina. A dose medida nesse ponto é devida, principalmente, à radiação espalhada pelo próprio volume irradiado, visto que a proteção reduz o feixe primário para 3,13% da intensidade inicia), e também a radiação espalhada pelas paredes da sala, como na figura 12 .

A dose esperada, que foi obtida por cálculo através da relação tecido ar (TAR) e que concorda com dados da IAEA,(1) corresponde a 10,5% da dose-tumor, enquanto a dose medida 11,3% .

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1- WEBSTER, E W andTSIEN K C. Atlas of Radiation Dose Distributions, Viena, publicação International Atonic Energie Agency. 1965 vol. I p. 84.


Medidas fora do feixe primário

Três dosímetros colocados na vagina, alinhados, fora do volume irradiado. A dose medida é devida ao espalhamento interno mais a radiação espalhada pelas paredes da sala.

Os três dosTmetros registraram uma dose media de17,1Rad, o que corresponde a cerca de 8,6% da dose-tumor.

Três pacientes, em tratamento de tumor de laringe tiveram dosimetria de dentes com os dosímetros colocados fora do campo de irradiação, junto ao dente incisivo inferior. 0 volume foi irradiado por dois campos paralelos e opostos, com dose de 200 Rad no centro.

A dosimetria de testículos foi realizada durante a irradiação da cadeia de gânglios abdominal e inguinal, em campos paralelos e opostos, anterior e posterior, aplicando um campo por dia com dose-tusnor de 200Rad. A técnica em uso para esse tratamento é chadada de Y invertido, Os testículos são protegidos do feixe primário por uma barreira de chumbo que reduz sua intensidade para 3,13% da inicial. Para reduzir a radiação espalhada, os testículos são colocados dentro de uma proteção em forma de ovo de páscoa. Os dosímetros foram colocados dentro da proteção, colados um no testículo esquerdo, um no testículo direito e outro sob o pênis. A proteção em que são colocados os testículos serã eficiente se colocada adequadamente. Por isso encontramos variações de leituras em diferentes pacientes. A dosimetria indica se uma proteção deve ou não ser corrigida.


Conclusão da segunda parte


Não é objetivo deste trabalho fazer análise de resultados clínicos, mas somente estudar e dominar a técnica de dosimetria por termoluminescência.

No capítulo I desta segunda parte, demos uma definição de Órgão crítico para um doente em tratamento com radiações. Essa definição foi necessária, porque irradiar um ser humano doente é absolutamente diferente de um trabalhador especializado que é exposto à radiação. A definição de um órgão como crítico depende de cada indivíduo, de cada paciente, devendo-se levar em conta se o órgão esta ou não doente, se está dentro ou fora do feixe primário. Entretanto apresentamos uma lista por tipos de tratamentos mais comuns.

No capítulo II apresentamos resultados de medidas in vivo como teste para o nosso dosímetro. Procuramos dosar inicialmente em pontos situados dentro do feixe primário, no raio central, pois aí temos consiência da dose em profundidade. Encontramos medida com erro de 0,5 % em relaçac a dose-tumor. Uma dosimetria com erro desta ordem só é conseguida normalmente com uma câmara de ionização. Afastando-se gradativamente do raio central, atingimos pontos onde a dose é desconhecida e imprevisível. Aí procuramos usar grupos de dosímetros ou repetir as medidas em outros pacientes portadores do mesmo caso.


TERCEIRA PARTE


Conclusão final


Na introdução deste trabalho, propusemo-nos mostrar que é possível fazer dosimetria por termo!uminescência com CaF2 natural, não da maneira como é produzida até o momento, mas da maneira mais simples como o dosímetro em pó. Para ser aceito como dosímetro, um material deve satisfazer a, pelo menos, cinco pontos básicos que são: sensibilidade, linearidade, desvanecimento, desvio-padrão e independência em relação à energia.

A sensibilidade deve ser suficiente para uma boa contagem na faixa de dose em que trabalhamos, A fluorita natural, nesse ponto, é surpreendente. Ela pode detectar doses como 10mRad com taxa de transformação de energia da radiação em fóton TL superior a todos os materiais em uso na dosimetria por termoluminescência.

A linearidade ê a propriedade mais importante para caracterizar um bom dosímetro. Todos os autores que estudaram esse cristal mostram que ele responde linearmente desde 10mRad até 100 KRad. A dosimetria na faixa de mRad requer um grande controle de background e, como no caso da fluorita, que. é muito, sensível a luz, exige instalação apropriada para tratamento do cristal e leitura dos dosímetros. Por isso estudamos a linearidade até 200 mRad como limite inferior. Para doses altas não passamos de 600Rad por falta de intersse prático.

No CaF2 natural usamos os picos de alta temperatura para dosimetria. Nenhum desvanecimento foi detectado para esses picos» Um dosímetro irradiado guarda informações por longo tempo sem prejuízo para a dosimetria.

0 desvio-padrao é função da faixa de dose em que trabalhamos. Na faixa de Rad ele é da ordem de 1,0% para o dosímetro em pó e é bastante influenciado pelo tipo de tratamento térmico e pelo controle de background.

Excetuando-se o Lí2B4O7:Mn e o LíF:Mg, todos os demais dosímetros termoluminescentes têm alta dependência da energia até cerca de 0,6MeV. Entretanto este é um problema de fácil solução, porque, se dosamos um feixe de expectro contínuo, este tem uma energia efetiva definida, se dosamos radiação ambiental, podemos usar filtros compensadores para caracterizar cada energia, como é o caso dos filmes dosimétricos.

Baseados nessas propriedades, que a fluorita satisfaz favoravelmente, não duvidamos da possibilidade de seu aproveitamento na dosimetria de rotina, lembrando ainda outras vantagens como a abundância, facilidade de obtenção e baixo custo. Para completar a conclusão de que a fluorita pode e deve ser usada na dosimetria, partimos para medidas experimentais que comprovassem essa possibilidade. Realizamos dosimetria no raio central de um feixe, em profundidade, com sucesso, conforme está no capítulo II da segunda parte.

Medidas fora do feixe primário foram realizadas. Nesse caso usamos grupos de dosímetros e efetuamos medidas em diversos pacientes, podendo observar entre medidas, variações que chegam a ser consideráveis. Essas variações, entretanto, não podem ser atribuídas ao dosímetro, porque é difícil reproduzir a mesma situação de dosimetria quando passamos de um paciente para outro. Essas variações são devidas a pequenas diferenças entre as irradiações dos pacientes e ao fato de não podermos reproduzir corretamente o sistema de proteçao. Podemos verificar pela dosimetria de testículos, que não há coincidência de dose entre os resultados apresentados. Em todos os casos o órgão dosado recebeu menor dose apôs a correção das proteções.

Concluímos, então, que a dosimetria deve ser executada para garantia de que um órgão sadio, que não suporta uma dose tumoricida, seja irradiado desnecessariamente.

Apesar de concluirmos que a fluorita natural pode e deve ser usada rotineiramente como dosímetro chamamos a atenção para suas limitações que, podem ser minimizadas se tomarmos certas medidas de precaução.

Para ser usada como dosímetro, a fluorita natural deve ser selecionada para termos cristais do mesmo tipo, isto é, cristais de mesma curva de emissão. Caso contrário incorreríamos no erro de concluir imediatamente que, a fluorita é imprestável para a dosimetria.

Na dosimetria utilizamos picos de alta temperatura. Se o dosímetro é exposto à luz, após receber tratamento térmico, esses picos podem ser sensibilizados e isso pode implicar grandes erros de leitura, dependendo da faixa de dose em que trabalhamos. Se o dosímetro está protegido, podemos garantir um trabalho com um mínimo de desvio.

Finalmente devemos ser cautelosos em restringir seu uso apenas a faixa de energia em que foi calibrado. A fluorita natural é altamente dependente da energia até cerca de 0,6 MeV.


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